Quantcast
Channel: crime – Aventar
Viewing all articles
Browse latest Browse all 50

Violação na Suíça: culpar a vítima, desculpabilizar o agressor. Outra vez.

0
0

Na Suíça, um violador português condenado a quatro anos e três meses de prisão efectiva viu a pena ser-lhe reduzida, por via de um clássico, por cá sobejamente conhecido: afinal, a culpa é da vítima.

O argumento usado pelo violador, para recorrer da decisão da primeira instância, resume-se a isto: o violador viu a mulher entrar num WC com outro homem e deduziu tratar-se de uma rapariga fácil, disponível para relações sexuais desprotegidas e não consentidas.

A dedução, digna de um homem das cavernas de moca em punho, que só caberia na cabeça de outro violador, coube também na cabeça da juíza Liselotte Henz, presidente do tribunal da relação que apreciou o recurso e que decidiu reduzir a pena do violador, argumentando que a vítima “enviou sinais aos homens com a sua roupa provocadora e atitude sedutora”.

Na civilizadíssima Suíça – pátria de grandes fortunas, bons chocolates e relógios, alegada neutralidade, lavagem de dinheiro e evasão fiscal, onde o racismo e a xenofobia costumam dar o ar da sua graça, excepto quando se trata da selecção nacional de futebol – como neste eterno residente da cauda da Europa que é o nosso Portugal, o problema mantém-se e deve ser combatido, pelo menos por aqueles que acreditam na democracia, defendem os direitos humanos e recusam as agendas e narrativas sexistas, misóginas e machistas. Não existe contexto algum que legitime uma violação. Uma mulher não pode ser parcialmente culpada por um crime cometido contra si porque usa uma mini-saia ou um decote. Quando uma mulher diz não, seja porque não quer passar dos beijinhos para o sexo, seja porque quer que o sexo termine, não pode ser forçada a continuar. Quem não percebe algo tão básico não tem condições para viver em democracia. A mulher não é uma boneca insuflável da qual o seu dono dispõe como quer.

P.S. Poder-se-ia pensar que estamos perante uma juíza ultraconservadora, a resvalar para o iliberal, eufemismo moderno para amaciar o extremismo de direita, mas não. Liselotte Henz é membro do FDP, um partido liberal suíço. Afinal, não é só por cá que o partido liberal alberga uns quantos iliberais.


Viewing all articles
Browse latest Browse all 50

Latest Images





Latest Images